Religião x Evangelho
Uma rápida reflexão a
partir do livro Cristo e Cultura de Richard Niebhur, págs. 16 e 17
Em tempos de tanta confusão e discursos em
nome de Deus, da família, igreja, religião e evangelho; sugiro a leitura e
reflexão das palavras abaixo descritas e retiradas do livro Cristo e Cultura de
H. Richard Niebhur, lançado no Brasil em 1967 pela editora Paz e Terra.
51 anos depois, as palavras introdutórias
do livro parecem ter sido escritas na semana passada, refletindo o majoritário
cenário religioso brasileiro atual. A quem interessa que a religião, e em
especial o Evangelho, seja transformado em "canga" e instrumento de
dominação, e diria mais, instrumento de alienação. Dentre as palavras abaixo,
tem uma frase que muito falou ao meu coração: "A fé é a semente fértil...é
o futuro...A fé é o desapego dos que aguardam a madrugada e não perdem tempo
olhando para trás". Que possamos ser portadores e testemunhas do Evangelho
e nunca queiramos ser "defensores".
Boa leitura e reflexão.
Do seu pastor e amigo
Wellington Santos.
“Sofrendo
o impacto do trabalho revolucionário de Marx, Kal Barth, o conhecido e
influente teólogo suíço, afirma que religião é mesmo a mais alta expressão do
pecado humano. Paul Tillich, teólogo alemão refugiado de Hitler nos Estados
Unidos, afirma que Jesus veio ao mundo para provar que a religião não compensa
e que o evangelho significa exatamente a libertação da canga da religião da lei
e da lei da religião. Estas afirmações ilustram certamente a necessidade de
ganharmos maior precisão nos termos que usamos corretamente nessa área.
É
necessário distinguir religião, canga e instrumento de dominação, de evangelho
– mensagem de libertação dos cativos; distinguir entre fé, resposta positiva ao
ato de libertação, e cultura – meio através do qual ela se deve expressar. É
necessário superar definitivamente conceitos como o de uma “fé religiosa”, pois
fé e religião são inconciliáveis. Uma só pode subsistir com o sufocamento da
outra. A fé é a semente fértil. A religião é a semente esterilizada que pode
servir para comer ou para o comércio. A fé é o futuro. A religião é o apego ao
passado, à insegurança, ao statu quo, muitas vezes feita em nome do futuro, e quase
sempre feita em benefício dos comerciantes. A fé é o desapego dos que aguardam
a madrugada e não perdem tempo olhando para trás. A fé é a loucura, a audácia.
A religião é a prudência, o instinto de conservação.
A
grande traição da Igreja como instituição consiste em que, ao invés de
constituir-se portadora e testemunha do evangelho, ela se apresentou como
“defensora” do evangelho. Isto na prática se refletiu num esforço de domesticar
o Evangelho, a serviço de determinada cultura e dos seus interesses arraigados.
Como resultado, ao invés de seguir o caminho da fé, a igreja se colocou na
defesa dos privilégios que lhe garantiam a segurança, na santificação do status
quo, e a religião resultante dessa traição tornou-se a principal sustentação da
ideologia das classes dominantes, da luta pela santificação dos objetos”.