27/09/2019

Boletim Dominical 29/09/2019


NORMANDIA, RESISTE!

Aos 60 anos, fiz minha primeira visita a um assentamento do MST, no Centro de Formação Paulo Freire, em Caruaru/PE. Chegamos no assentamento, meu coração batia forte pois eu estava muito ansiosa para este primeiro encontro. Queria ver, falar e dizer para todxs aquelxs pessoas que somos irmxs e que estamos do mesmo lado da luta por justiça e dignidade. Do portão de entrada até o auditório todxs nos cumprimentavam com muita cordialidade. Meus olhos percorriam cada canto daquele lugar. De repente um vento forte acariciou meu rosto, causando-me uma sensação tão boa por estar ali. Entramos no auditório, onde estava acontecendo uma plenária. Imediamente pegaram nossos nomes para apresentar nossa pequena e singela comitiva. Enquanto a reunião acontecia, gritos de ordem eram dados, causando-me mais uma vez profunda emoção. Mulheres líderes no comando da reunião, rostos sofridos de todas as idades e marcados pelo sol, de forma organizada discutiam acerca da resistência. Naquele exato momento tive que começar a desaprender e desconstruir tudo que tinha ouvido durante todo esse tempo através da mídia e das opiniões dos que, distantes da realidade, apenas reproduzem o que ouvem todos os dias sem senso crítico.
Dou glórias a Deus pela minha comunidade de Fé, pelo envolvimento dos meus pastores Wellington e Odja. Nos foi concedida a palavra para uma saudação que logo se transformou numa palavra de ânimo, força e fé proferidos pelos pastores Wellington, Odja e Vando. Fiz uma fala de saudação breve e emocionada que me aproximou ainda mais daquelxs homens e mulheres. Foi um momento enriquecedor e marcante para minha vida e formação. Em seguida, fomos conhecer a horta comunitária em formato de mandala, que em meio a tantas belezas ainda era adornada com inúmeros girassóis, tornando aquele lugar ainda mais belo e especial. Seguimos para o almoço. Mais um momento especial e marcante. A quantidade de pessoas me assombrou, era tanta gente que nossos encontros, viagens missionárias e acampamentos, ficavam pequenos diante daquela multidão de trabalhadores e trabalhadoras acampadas naquele lugar para resistir à violência da tentativa do despejo após 20 anos de construção de sonhos.  Novamente a organização chamou muito a minha atenção. Todxs comeram igualmente, cada um com suas singelas vasilhas, se alimentaram, lavando-as em seguida, deixando todo lugar rapidamente limpo.
Meu Deus, como ouvi tantos absurdos durante este tempo a respeito do MST. Conhecendo Helena, assentada do MST, lutando como eu para vencer um câncer. Senti que preciso não só desconstruir falsos conceitos acerca do MST como também me unir à luta por uma reforma agrária séria e profunda em nosso país. Quando chegou a hora de voltar, queria ficar mais um tempo, decidindo no meu coração que voltarei, pois, preciso desaprender para aprender com meus irmxs do MST a compartilhar tudo como vi naquele lugar. Meu coração está muito grato à Ruah que soprou esse vento de amor e aprendizado na minha vida. Saí refletindo depois de algumas horas naquele acampamento se de fato nós sabemos mesmo como viver em comunidade. Esta viagem de solidariedade ao Centro de Formação Paulo Freire acabou sendo um grande presente para minha vida.
Quero concluir com as palavras da pastora Odja ao falar na plenária, citando Margarida Alves: "Medo nós tem, mas não usa". Que saiamos da nossa zona de conforto, ampliemos nossa visão e nos aproximemos mais daquelxs que lutam por dignidade, afim de construir nosso próprio conceito acerca desta luta. Hoje, me uno aquelxs trabalhadorxs para dizer bem alto: Normandia, resiste!

Missionária Sandra Helena