NORMANDIA, RESISTE!
Aos 60 anos, fiz minha
primeira visita a um assentamento do MST, no Centro de Formação Paulo Freire,
em Caruaru/PE. Chegamos no assentamento, meu coração batia forte pois eu estava
muito ansiosa para este primeiro encontro. Queria ver, falar e dizer para todxs
aquelxs pessoas que somos irmxs e que estamos do mesmo lado da luta por justiça
e dignidade. Do portão de entrada até o auditório todxs nos cumprimentavam com
muita cordialidade. Meus olhos percorriam cada canto daquele lugar. De repente
um vento forte acariciou meu rosto, causando-me uma sensação tão boa por estar
ali. Entramos no auditório, onde estava acontecendo uma plenária. Imediamente
pegaram nossos nomes para apresentar nossa pequena e singela comitiva. Enquanto
a reunião acontecia, gritos de ordem eram dados, causando-me mais uma vez
profunda emoção. Mulheres líderes no comando da reunião, rostos sofridos de
todas as idades e marcados pelo sol, de forma organizada discutiam acerca da
resistência. Naquele exato momento tive que começar a desaprender e
desconstruir tudo que tinha ouvido durante todo esse tempo através da mídia e
das opiniões dos que, distantes da realidade, apenas reproduzem o que ouvem todos
os dias sem senso crítico.
Dou glórias a Deus pela
minha comunidade de Fé, pelo envolvimento dos meus pastores Wellington e Odja.
Nos foi concedida a palavra para uma saudação que logo se transformou numa
palavra de ânimo, força e fé proferidos pelos pastores Wellington, Odja e
Vando. Fiz uma fala de saudação breve e emocionada que me aproximou ainda mais
daquelxs homens e mulheres. Foi um momento enriquecedor e marcante para minha
vida e formação. Em seguida, fomos conhecer a horta comunitária em formato de
mandala, que em meio a tantas belezas ainda era adornada com inúmeros
girassóis, tornando aquele lugar ainda mais belo e especial. Seguimos para o
almoço. Mais um momento especial e marcante. A quantidade de pessoas me
assombrou, era tanta gente que nossos encontros, viagens missionárias e
acampamentos, ficavam pequenos diante daquela multidão de trabalhadores e
trabalhadoras acampadas naquele lugar para resistir à violência da tentativa do
despejo após 20 anos de construção de sonhos.
Novamente a organização chamou muito a minha atenção. Todxs comeram
igualmente, cada um com suas singelas vasilhas, se alimentaram, lavando-as em
seguida, deixando todo lugar rapidamente limpo.
Meu Deus, como ouvi tantos
absurdos durante este tempo a respeito do MST. Conhecendo Helena, assentada do
MST, lutando como eu para vencer um câncer. Senti que preciso não só
desconstruir falsos conceitos acerca do MST como também me unir à luta por uma
reforma agrária séria e profunda em nosso país. Quando chegou a hora de voltar,
queria ficar mais um tempo, decidindo no meu coração que voltarei, pois,
preciso desaprender para aprender com meus irmxs do MST a compartilhar tudo
como vi naquele lugar. Meu coração está muito grato à Ruah que soprou esse
vento de amor e aprendizado na minha vida. Saí refletindo depois de algumas
horas naquele acampamento se de fato nós sabemos mesmo como viver em
comunidade. Esta viagem de solidariedade ao Centro de Formação Paulo Freire
acabou sendo um grande presente para minha vida.
Quero concluir com as
palavras da pastora Odja ao falar na plenária, citando Margarida Alves: "Medo
nós tem, mas não usa". Que saiamos da nossa zona de conforto, ampliemos
nossa visão e nos aproximemos mais daquelxs que lutam por dignidade, afim de
construir nosso próprio conceito acerca desta luta. Hoje, me uno aquelxs
trabalhadorxs para dizer bem alto: Normandia, resiste!
Missionária
Sandra Helena