Por Rogério Leite
No último fim de semana, estivemos na cidade de Japaratinga, litoral norte de nosso Estado. Com o pretexto de evangelizar, fui com Gleide e Rian, juntamente com alguns poucos irmãos de nossa igreja aquele município. Já o conhecia, principalmente sua belíssima praia que, por sinal, fica defronte à casa em que está instalada a Congregação da Igreja Batista do Pinheiro em Japaratinga.
Usei a expressão “pretexto” porque, sinceramente, não foi este o motivo que me levou a Japaratinga. Quando a inscrição da viagem missionária foi aberta, pensei comigo que esta seria uma ótima oportunidade de fazer um turismo de veraneio, afinal estamos no mês de janeiro.
Parece-me, no entanto, que Deus não planejava para mim a mesma coisa que eu. Afirmo isto, devido a alguns episódios responsáveis por esta reflexão.
Ao chegarmos sexta-feira, tivemos uma rápida reunião dirigida pelo Pr. Wellington, o qual determinava algumas diretrizes para o bom andamento da viagem, tais como: tarefas, horários, regras, acomodações e objetivos para alcançarmos. Em seguida, começaram a acontecer alguns fatos, os quais eu fiz referência acima.
No mesmo dia, fui impactado com a voz embargada e regada de lágrimas de nossa irmã Bete, que repentinamente entra em casa, voltando de uma rápida ida à beira-mar para deliciar uma das mangas que estavam ali ao nosso dispor, dizendo: “O que é esta dor que eu sinto no meu braço, resquício do que me aconteceu, se Deus me deu a oportunidade de saborear esta manga, contemplando esta obra tão maravilhosa? Obrigada, meu Deus!” Meu propósito de turismo começa a desabar... Não faço ideia do sentimento de Bete naquela hora, já que não passei por sua luta, muito parecida com a de minha esposa Gleide, esta sim também em lágrimas.
Neste mesmo dia, fui convidado por alguns irmãos para ir ao Alto da Repetidora, local marginalizado da cidade por sua aparência e condição paupérrima. Mais uma vez, Deus me confronta com o meu pretexto de evangelizar, deparando-me com a casa de uma mocinha que fizera uma cirurgia e estava sendo visitada naquele momento por Rose e Mari, especificamente por já terem iniciado um trabalho evangelístico naquele lugar.
Nesta casa, em que corre na sala um esgoto, vivem a mãe e duas crianças abandonadas pelo pai, que ao ir embora levou consigo todos os documentos e os extraviou, deixando a criança de 12 anos impossibilitada de frequentar a escola por falta de documento. Ora, tão simples resolver! Não é só tirar outro registro de nascimento? Seria, se eu não tivesse esquecido de relatar que esta família não tem renda e o cartório da cidade cobra R$ 40,00 para emitir nova certidão. Neste momento pensei no bolsa-escola... aquele programa social do Governo Federal que dá dinheiro às famílias de baixa-renda que tem filho matriculado na escola. Que egoísmo o meu! Imaginou? Eu não tinha noção da realidade daquele ponto turístico alagoano. Naquela visita, não conseguimos encontrar a menina recém-operada, já que esta havia saído para pegar manga, possivelmente a oportunidade de se alimentarem sem pagar.
No sábado pela manhã, tivemos a devocional logo cedo após o farto café, um estudo bíblico sobre o Espírito Santo de Deus. Muito se falou, mas lembro-me de uma frase específica: “O Espírito Santo de Deus é livre e sopra para todos os lados”. Mas como, se no dia anterior vi tanta miséria? É que alguns, egocêntricos e aproveitadores, tentam impedir o sopro do Espírito. A condição de miséria daquele povo do Alto da Repetidora é fruto da vaidade e do egoísmo de muitos de nós, já que não tem Alto da Repetidora apenas em Japaratinga.
À noite, deslocamo-nos até Porto Calvo para o culto de posse do Pr. Jefferson na Igreja Batista de Porto Calvo. A Palavra de Deus naquela noite foi basicamente“Dar sem expectativa de receber”. Uma celebração belíssima, com louvores antigos e leves, um acolhimento muito bom de sentir dos irmãos de Porto Calvo, sem falar no bolo... Mais uma vez, Deus me fez pensar: Eu dei o quê? E quando dei, pensava em receber? Lembrei-me de João 15:1-6. Aqui confesso que fiquei confuso, pois não havia dado nada a Deus e ao próximo e acabei de receber uma “pancada” do Espírito.
No domingo pela manhã, tivemos nossa devocional com os irmãos de Porto Calvo e Ouriçangas. Tivemos um belo churrasco na companhia destes irmãos, sendo presenteados com carnes de boi e carneiro ofertadas por um dos irmãos de Porto Calvo. No fim da tarde, antes de voltarmos a Maceió, tivemos um culto vespertino e ali Pr. Wellington pediu para que voluntários, usando apenas uma palavra, sintetizassem tudo que havia acontecido. Então, foi dito: compromisso, unidade, amizade, dar, frutificar, permanecer...
Assim, o Espírito Santo de Deus acabou com o resto de meu projeto inicial de turismo e descanso. A palavra que veio a minha mente foi vergonha. Automaticamente, fui transportado (figura de linguagem, pois não houve nenhuma experiência sobrenatural) para 2 Coríntios 5:14-15.
Lembrei-me do dia em que tive o pulsar mais forte do coração ao ouvir a Palavra de Deus, aquela coisa diferente e inexplicável, que transcende o conhecer humano e fiquei vergonhosamente constrangido no meu íntimo, simplesmente porque o Amor que um dia eu conheci e me foi apresentado por alguém, eu estou negligenciando e fazendo com que outras pessoas deixem de experimentar aquilo que eu senti um dia e voltei a sentir este fim de semana.
Esse sentimento que o meio evangélico erroneamente chama de primeiro amor é uma nova roupagem de como queremos Deus, pois só voltamos a sentir o tal primeiro amor quando estamos em apuros, seja de que natureza for: saúde, financeira, emocional, conjugal... Não posso conceber este primeiro amor como sendo aquele mesmo explicitado em 1 Coríntios 13, pois segundo a Palavra ele é dom supremo e não procura seus interesses.
Finalizo, louvando a Deus pelas vidas desta igreja (templo do Espírito Santo de Deus) que saem de seus bancos inertes, pedindo a permissão da motivação das lágrimas de Mano no último acampamento dos homens e invocando 1 Coríntios 13:13, já que não sou santo, mas também não sou desgraçado, pois onde abundou o pecado, superabundou a graça, segundo Romanos 5:20.